Mídia no Brasil: Para democratizar é preciso implementar meios locais e comunitários
- Eula D.T.Cabral

- 13 de nov.
- 4 min de leitura
Democratizar a mídia no Brasil é possível? Sim. Mas, é preciso ter estratégias claras e que possam ser colocadas em prática, principalmente pela sociedade. Nos estudos de Cabral e Cabral Filho (2024, p.16), para democratizar a mídia no Brasil é preciso levar em consideração cinco desafios: "a reformulação das políticas públicas, a apropriação das novas tecnologias pela sociedade, a diversidade de produtores capacitados e qualificados para acessar e exercer o controle sobre os meios de grande circulação, a implementação de meios locais e comunitários e a defesa da comunicação, da cultura e da informação como direitos de todos”.
Esse conceito de democratização da comunicação, da cultura e da informação, que leva em consideração as três áreas controladas pela mídia, foi formulado por Eula Cabral e Adilson Cabral Filho e registrado no capítulo "Democratização da comunicação, da cultura e da informação no Brasil e o papel das rádios comunitárias", publicado no ebook Democratização da Cultura, da Comunicação e da Informação na era digital (Cabral e Cabral Filho, 2024). Ele também vem sendo adotado na pesquisa Cultura, Comunicação e Informação na era digital (Cabral, 2025) e na obra Economia Política da Comunicação, da Cultura e da Informação (2025).
Nas colunas anteriores foram abordados três desafios e hoje trabalharemos com a implementação de meios locais e comunitários.
No dia 8 de outubro de 2025, analisa-se o primeiro desafio da democratização da comunicação, da cultura e da informação: reformulação das políticas públicas. No dia 29 de outubro de 2025, o segundo desafio: apropriação das novas tecnologias pela sociedade. No dia 5 de novembro de 2025, trabalha-se o terceiro desafio: diversidade de produtores capacitados e qualificados para acessar e exercer o controle sobre os meios de grande circulação.
Hoje a análise leva em consideração o quarto desafio: a implementação de meios locais e comunitários. Mas, como implementar meios locais e comunitários no Brasil diante de uma legislação inadequada para a realidade brasileira?
Pesquisadores que vêm atuando no campo observam a importância de se mapear e auxiliar os meios locais e comunitários no Brasil, auxiliando os pequenos grupos em como manter seus veículos funcionando e com programação de qualidade. É o caso de Adilson Cabral, que estuda a mídia comunitária do país. Um de seus estudos é "A sustentabilidade nas políticas públicas para o audiovisual comunitário", publicado na obra Reivindicar el cambio: comunicación popular, comunitaria y ciudadanía en América Latina (2022).
De acordo com os estudos do pesquisador Adilson Cabral, as rádios contribuem para o desenvolvimento local, o desdobramento da comunidade como um todo, sendo fundamental para que haja uma mídia democrática no país. Em entrevista dada à Fundação Perseu Abramo, em 2009, ano em que foi realizada no Brasil a Conferência Nacional de Comunicação, fala sobre a presença das rádios comunitárias na sociedade, destacando que elas “são uma contribuição para o desenvolvimento local, num primeiro momento, e para o desdobramento da comunidade como um todo”. As rádios comunitárias fazem diferença no local onde estão. No entanto, esse meio de comunicação, que é fundamental à sociedade, tem uma legislação que precisa ser revista para que democratize a mídia no Brasil. O serviço de radiodifusão comunitária foi instituído pela Lei nº 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, e regulamentado pelo Decreto nº 2.615, de 3 de junho de 1998. A legislação deveria ter sido construída em prol da importância da rádio na comunidade e da democratização desse meio de comunicação, mesmo diante do domínio do mercado midiático por conglomerados privados. Mas, por que isso não aconteceu no Brasil?
A Lei nº 9.612, de 19/2/1998, foi assinada no governo de Fernando Henrique Cardoso. Ela restringiu e quase aniquilou em seus registros a rádio comunitária. No primeiro artigo registrou-se que a rádio comunitária, em um país que tem realidades geográficas diferenciadas, precisa ter “freqüência modulada, operada em baixa potência e cobertura restrita, outorgada a fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos”. A potência deve ser “limitada a um máximo de 25 watts ERP” e altura da antena, o sistema irradiante, não pode ser superior a 30 metros.
O Decreto nº 2.615, de 3/6/1998, que regulamenta a Lei nº 9.612, de 19/2/1998, que institui o serviço de radiodifusão comunitária, “esclarece”, em seu artigo sexto, que a cobertura da emissora deve ser limitada “por um raio igual ou inferior a mil metros a partir da antena transmissora, destinada ao atendimento de determinada comunidade de um bairro, uma vila ou uma localidade de pequeno porte”. Mas, como controlar as ondas eletromagnéticas em lugares com morros? Não se pode ter rádio da comunidade em lugares como a cidade do Rio de Janeiro? É fato que os artigos da Lei e do Decreto ignoram a realidade geográfica do país e o cotidiano da maioria dos brasileiros, mas até quando a legislação será mantida de forma equivocada? Não se pode ignorar a importância da rádio comunitária em cada rua, bairro e cidade. Ela aproxima as pessoas e leva informações que são de interesse da comunidade, ou seja, é essencial em qualquer lugar do Brasil. Como ignorar os períodos de pandemia, guerras locais, tiroteios, enchentes, queimadas e chamamentos para vacinas etc? Faz-se necessário rever a legislação atual sobre rádio comunitária, trabalhá-la como um meio de comunicação que está inserido no sistema público, necessitando de total apoio, inclusive financeiro, do Estado.
A democratização da mídia exige reformulação de políticas públicas, apropriação das novas tecnologias pelos membros da sociedade, diversidade de produtores capacitados e qualificados para acessar e exercer o controle sobre os meios de grande circulação, com meios locais e comunitários, e as áreas de comunicação, cultura e informação sejam levadas a todos como direitos. Sim. Precisamos da: 5. defesa da comunicação, da cultura e da informação como direitos de todos” (CABRAL, CABRAL FILHO, 2024, p.16). Desafio que abordaremos na próxima edição de nossa coluna.

Autora: Eula D.T. Cabral
Doutora e Mestre, com pós-doutorado, em Comunicação Social.
Autora da obra Concentração da mídia no Brasil: radiodifusão e telecomunicações (2023).
Rio de Janeiro (RJ), 12/11/2025.
*Mídia no Brasil é publicada toda quarta-feira no site EPCC.

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